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Marcos Kim Para o Roberto Leung, o mais amado dos poucos e bons amigos Pô, faz muito tempo mesmo, hein? Já nem sei. Pois é... Mas então, você perguntou se tá tudo bem. Olha: quer saber mesmo? Tem certeza? Então vou contar sem resumo da ópera, até porque essa minha vida não é ópera, é tragicomédia. E aí que eu tive duas arritmias. Em menos de um mês. Eu já tive antes, você lembra, mas tão seguido foi f***. O cardiologista falou: Mas enfim, ele falou que, com a idade, a tendência é melhorar. Já viu isso? Quem diria que meu coração vai melhorar com a idade? Tomara que seja em todos os sentidos. Pô, nem pergunta. É, nesse sentido também vai mal! Você tá ligado que eu vivo me apaixonando, mas a última doeu até nos rins. Foi daquelas que eu já me vi casado e com 2,42 filhos, pra manter a estatística da classe mérdia. É, eu quero ficar na mérdia. Aí rolou o ciclo adolescente de sempre: encantamento à primeira vista, conversas intermináveis ao telefone, encontro, beijos e tal, flutuada básica até as nuvens, queda brusca de cabeça, desentendimento, emputecimento e frustração. A trajetória parabólica toda, e nem sei se gastei três dias nisso. Tô ficando rápido nisso. É a prática! Que bosta… A depressão? A depressão taí, firme e forte! Eu tô sabendo que é o mal do século, mas não queria que fosse o meu mal, pô! Lembra que eu já tive aquelas crises, inclusive queria me jogar do viaduto perto de casa, em cima da 23 de Maio etc? Mas fica frio, não vou me jogar de viaduto nenhum, até porque, com este cabeção, eu afundo a lataria dum ônibus e esmago o cobrador e mais dezessete passageiros. Seria um cabecídio culposo. Mas enfim, finalmente encarei um médico, ele me receitou antidepressivo. Pô, eu nunca tinha visto essas receitas controladas, em duas vias e tal. Antidepressivo. Fiquei até preocupado. Sério. Eu achava depressão uma frescura, sei lá, aquela coisa do tipo “Os Sofrimentos do Jovem Werther”. De quem é mesmo? Goethe? Mas enfim, desta vez parei de trabalhar, praticamente. Não tenho patrão, então me auto-demiti. Larguei quase tudo. O dinheiro, portanto, não tá entrando, só saindo. Aí comecei a falar com uns amigos. Pô! Ou todo mundo virou afrescalhado ou depressão virou gripe. Dos quatro que conversei, três tão nessa. É mole? A gente deveria criar comunidade no Orkut: DNTA - Deprimidos Não Tão Anônimos. Falando em Orkut, que máquina de fazer doido é aquela? Que vício desgraçado! A maior reunião de solitários do mundo. O Poço das Carências! Todos entram usando o pretexto de reencontrar velhos amigos. Até encontra: “Ah, vamos manter contato!” Mantém contato nada. O povo quer é conhecer gente nova, ficar, namorar, casar, ter 2,42 filhos… E aí conhece um porrilhão de pessoas, mas não sabe realmente nada sobre ninguém. Quantas pessoas me adicionam, depois entram no meu MSN e se surpreendem: “ah, você é fotógrafo?”. Meu! Ninguém nem lê nada! Tá lá no perfil!!! Agora vou dizer que sou um estuprador e assassino serial foragido da Justiça, vamos ver se alguêm lê. Aí aparece um scrap: “Oi, tudo bem, Marcos? Gostei do seu perfil, podemos nos conhecer? Você parece muito simpático! Beijinhos!” Isso mesmo, querida, vem cá conhecer um estuprador assassino serial foragido simpático. E depois de um tempo a tal Lista de Amigos do Orkut parece um Mausoléu: Homenagem ao Amigo Desconhecido. Quem é aquele monte de anônimos? Até parece que você faz amigos clicando em um “Sim”. E nunca a palavra Comunidade foi tão mal usada. Você olha os membros e parece um cemitério cheio de fotos em cerâmica. Lápides com rostos dos mortos virtuais. Um cadáver é mais real, e pelo menos é útil de alguma forma. Carne Dada aos Vermes, daí vem a palavra cadáver. Orkut nem pra alimentar verme serve. O mal do século não é depressão: é a carência. E essa não tem cura. Não tem amor neste mundo que supra a carência de um único ser humano. A gente sempre vai estar no déficit, em maior ou menor grau. Haja antidepressivo! Se você juntar depressão, carência, solidão e stress, o que dá? Um paulistano. Mas o Orkut até tem seu lado bom, rola uns encontros, umas afinidades, umas raras trocas de informações úteis, embora basicamente seja um manancial inesgotável de inutilidades, é a perfeita antítese da Biblioteca de Alexandria. Eu comparo o Orkut a um anabolizante: você até pode usar, desde que o médico indique, controle e defina muito bem o período a usar, que é o minimamente necessário. Depois, nunca mais. Um parênteses de cultura inútil: sabia que a primeira biblioteca do mundo foi a de Mênfis? Não a Memphis do Elvis, porra, a do Egito. Foi fundada por Ramsés II, há três mil anos atrás. Ele a apelidou de “Remédio dos Tesouros da Alma”. E hoje em dia a gente tem o quê? Livrinho de auto-ajuda… Que a múmia do faraó desperte e amaldiçoe certas editoras. Mas voltando pro assunto depressão. Um amigo leu o seguinte: 70% dos homens sofre disso. Pô, quase todos! E a gente não vê porque a maioria dissimula, tem vergonha de admitir e não se trata. E aí, de crise em crise, só piora. Foi o que aconteceu comigo. É sempre bom conversar sobre essas coisas, de repente mais homens se tocam (ui!) e procuram ajuda. Pra completar, tem o tal de Inferno Astral, cara. Dezessete de dezembro taí, completo 37. Caramba, quase 40! Sabe aquela, “no creo en brujas, pero que las hay, las hay”? Entonces, no creo en “astrolojia”, pero que hay “esta puerra de Infierno Astral”, hay! Não sei o que é mais podre, esse meu portunhol ou o português que circula na internet. Qualquer dia desses alguém vai escrever num blog: consulte o dissionário. Se já não escreveu. Dissionário poderia ser uma comunidade do Orkut, cuja galera que é dissidente da língua portuguesa. Que só usa dicionário pra ver se alcança uma prateleira. Mas enfim, todos os amigos deprês disseram o seguinte: “exercício!”. Concordo. O corpo é sábio, é de Deus, cara, produz a própria cura, se você ajudar. Isso sim é auto-ajuda. Tô muito paradão. Esse meu lindo corpinho em plena forma - de kibe - tá virando uma carcaça. Vai virar um cadáuru. Carne dada aos urubus. Começo hidroginástica semana que vem, porque meu joelho também tá ruim. Vou ser o muso das sexagenárias! Ah, e cortei ou reduzi um monte de coisas: cafeína, gordura, refri… Nem tô sentindo falta, tô na boa, dimunuí aos poucos, isto funciona. E tô dançando que nem um louco, sozinho aqui em casa, comprei uma caixa fabulosa do James Brown, 50 anos de carreira: DVD e dois CDs. Fico suando que nem um porco, e me sinto mais limpo. Perdi três quilos, até porque a depressão me tirou o apetite. Mas enfim, olha a comédia: fui num barzinho esses dias, chamado Beverly Hills. Lá tem sketches humorísticos. Pô, dei risada demais! Completamente hilário! E sabe a Nany People? Aquele Objeto Sexual Não-Identificado? Meu! Ela zoou muuuito com a minha cara… Tava no palco e falou: E aí veio a pergunta inevitável: Viu só? Eu e Nany People. Não é um luxo, santa??? Tirei até foto com ela. Vê lá no meu álbum do Orkut. Marcos Kim mesmo, não tô usando apelido. Aliás, tem vinte Marcos Kim no Orkut… É mole? Mudando de pato pra ganso: conversei ontem no MSN com uma ex-namorada, aquela bem antiga, com quem quase casei, sabe? Ela contou que vai casar agora em janeiro. Tá grávida. Eu não soube o que dizer. Não soube nem o que sentir. Acho que me doeu o tempo passando: e eu? Nesses momentos, vejo que Deus é inglês: ele empresta à vida um certo sarcasmo britânico. Cara, do jeito que as coisas estão loucas e difíceis, vou ver se eu arranjo um marido. Quero ser a esposa que não trabalha, faz a comidinha, uma faxininha em casa – que faxina nada, o maridão paga a diarista –, compras no shopping, ginástica na academia, pede o divórcio, fica com a casa e, pra coroar de vez, ainda recebe pensão. Não quero mais ser fotógrafo nem imagemaker. Quero botar no cartão de visita: Marcos Kim - ex-esposa. Ou melhor: consultora de espoliação marital. Mas o que eu tô precisando mesmo é de catarse. Catarse. Sabe que tem vários significados? Me surpreendi, vendo o dicionário. Sim, claro, é purificação, limpeza e tal. Aliás, tenho caminhado muito ultimamente, faz um bem danado, purifica, alivia. Não é à toa que os budistas e os aristótelicos gostavam de caminhar, né? Ainda vou escrever uma crônica sobre uma excelente zen-caminhada lá na Pedra Grande, no Parque da Cantareira, com minha mãe e minha tia, aquela figuraça doida. Adoro as doidas. Elam temperam a vida. Mas enfim, vendo no dicionário mais sobre catarse, na psicologia: “efeito salutar provocado pela conscientização de uma forte lembrança que estava reprimida”. E no teatro: “o efeito moral e purificador da tragédia clássica, conceituado por Aristóteles, cujas situações dramáticas trazem à tona os sentimentos de terror e piedade dos espectadores”. Mas também é evacuação, natural ou não, provocada por qualquer via. Enfim, tô precisando de catarse em todos os sentidos, tô precisando de conceitos peripatéticos aristotélicos, de lembranças catafáticas catalíticas catalisadoras, além duma boa cagada. Pô, será que eu deveria escrever um blog? Afinal, bosta por bosta... Mas é isso aí, cara. A vida tá assim. Coração em curto-circuito, paixão-relâmpago, depressão, Inferno Astral, fantasmas do passado, carência orkutiana, James Brown até cair e um travesti que me mata de rir. A boa e velha tragicomédia do dia a dia. Fora isso, tá tudo bem. E você? Marcos Kim – 05.12.2005 LINKS: Beverly Hills: http://www.bhills.com.br/ |
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